Professor Anselmo com nossa turma Iced, em 2011 - Grande mestre esse cidadão |
Lembro com ternura e saudade de uma cena ocorrida no dia 15
de outubro de 1982. Faz trinta anos. Ao chegar a meu sagrado local de trabalho
– a sala de aula – me deparei com uma frase enorme escrita com giz na lousa
verde: “Salve o Mestre – Parabéns pelo dia do Professor”. Enquanto meus olhos
percorriam as letras caprichosamente desenhadas, eu era ovacionado por crianças
em passagem para a adolescência e adolescentes que ora queriam ser crianças,
ora desejavam antecipar a suposta liberdade do adulto. Alguns salgados, um bolo
e refrigerantes. Tudo muito singelo, mas como era feito de coração,
representava a mais pomposa homenagem que eu poderia imaginar receber naquela
data.
Outras vezes a homenagem se repetiu, não da mesma forma e
nem sempre na mesma data, mas aqueles anos em que trabalhei na educação básica
ficaram eternizados por estas e outras doces lembranças. Percebi com o passar
do tempo que nos níveis mais elementares o reconhecimento ao trabalho do
professor é mais espontâneo e explícito. Desde o ano de 1994 exerço a docência
em universidades, e nunca mais vivi momentos como aqueles. Mas também não sei
dizer se os professores da educação básica continuam sendo homenageados. Talvez
a mudança de atitude tenha atingido a todo o sistema educacional. E se isto é
verdadeiro, é uma perda lamentável para um profissional que já enfrenta a
amnésia das autoridades que deveriam prestigiá-lo. Mas neste caso não me refiro
a fazer festa, parabenizar ou apertar suas mãos, por mais afetuosamente que
seja. Porque não basta fazer festa em um dia, e tratar mal no restante do ano.
Não basta elogiar a dedicação e o esforço, sem que haja a retribuição justa na
forma de salário e de condições dignas para o exercício da profissão.
Aqueles que, como eu, decidiram ser professor e permanecem
sendo em meio a outras sedutoras possibilidades, acredito que o fizeram por
acreditar que podem contribuir para a construção de uma sociedade melhor, na
qual o conhecimento seja o antídoto contra todas as formas de opressão, de
preconceitos e de inverdades. A educação pode transformar pessoas e sociedades.
O professor auxilia a transformar dados brutos em conhecimento elaborado. Faz a
mediação, por meio do ensino, entre o conteúdo a ser apreendido e o ser
aprendente. E tendo em vista que todos “ninguém sabe tudo, e ninguém ignora
tudo”, como afirmou o grande educador Paulo Freire, somos dependentes uns dos outros,
e mais ainda dos professores.
Não se pode mudar o mundo sem mudar as pessoas: mudar o
mundo e mudar as pessoas são processos interligados, nos quais a educação é a
força impulsora. Sem a educação não existe vida no sentido pleno. Existe tão
somente a sobrevivência. A compreensão sobre o modo como funciona a sociedade,
desvenda as estruturas de dominação e abre caminho para a formação crítica que
permite o questionamento de tudo aquilo que se esconde sob a aparência da
obviedade. É por esta razão que a educação incomoda, pois ela pode tornar um
povo difícil de governar, e impossível de ser escravizado.
Se escrevi este texto é porque fui ensinado a organizar as
letras em palavras e a dar sentido a elas em frases e parágrafos. Devo isto a
meus professores, e procuro retribuir ensinando com dedicação e gosto. Acredito
que nisto reside a grandeza e a beleza de ser professor. Aquele que gosta do
que faz e sente orgulho pelo que realiza, é feliz. Sou professor, sou
realizado, sou feliz. Parabéns aos professores que, apesar de tudo, se dedicam
a ajudar pessoas a se realizarem e, por isso, são merecedores de respeito e
consideração.
Professor Dr. Anselmo Alencar Colares