segunda-feira, outubro 15, 2012

MEMÓRIAS DE PROFESSOR – 30 ANOS DEPOIS!

Professor Anselmo  com nossa turma Iced, em 2011 - Grande mestre esse cidadão

 Lembro com ternura e saudade de uma cena ocorrida no dia 15 de outubro de 1982. Faz trinta anos. Ao chegar a meu sagrado local de trabalho – a sala de aula – me deparei com uma frase enorme escrita com giz na lousa verde: “Salve o Mestre – Parabéns pelo dia do Professor”. Enquanto meus olhos percorriam as letras caprichosamente desenhadas, eu era ovacionado por crianças em passagem para a adolescência e adolescentes que ora queriam ser crianças, ora desejavam antecipar a suposta liberdade do adulto. Alguns salgados, um bolo e refrigerantes. Tudo muito singelo, mas como era feito de coração, representava a mais pomposa homenagem que eu poderia imaginar receber naquela data.


Outras vezes a homenagem se repetiu, não da mesma forma e nem sempre na mesma data, mas aqueles anos em que trabalhei na educação básica ficaram eternizados por estas e outras doces lembranças. Percebi com o passar do tempo que nos níveis mais elementares o reconhecimento ao trabalho do professor é mais espontâneo e explícito. Desde o ano de 1994 exerço a docência em universidades, e nunca mais vivi momentos como aqueles. Mas também não sei dizer se os professores da educação básica continuam sendo homenageados. Talvez a mudança de atitude tenha atingido a todo o sistema educacional. E se isto é verdadeiro, é uma perda lamentável para um profissional que já enfrenta a amnésia das autoridades que deveriam prestigiá-lo. Mas neste caso não me refiro a fazer festa, parabenizar ou apertar suas mãos, por mais afetuosamente que seja. Porque não basta fazer festa em um dia, e tratar mal no restante do ano. Não basta elogiar a dedicação e o esforço, sem que haja a retribuição justa na forma de salário e de condições dignas para o exercício da profissão.

Aqueles que, como eu, decidiram ser professor e permanecem sendo em meio a outras sedutoras possibilidades, acredito que o fizeram por acreditar que podem contribuir para a construção de uma sociedade melhor, na qual o conhecimento seja o antídoto contra todas as formas de opressão, de preconceitos e de inverdades. A educação pode transformar pessoas e sociedades. O professor auxilia a transformar dados brutos em conhecimento elaborado. Faz a mediação, por meio do ensino, entre o conteúdo a ser apreendido e o ser aprendente. E tendo em vista que todos “ninguém sabe tudo, e ninguém ignora tudo”, como afirmou o grande educador Paulo Freire, somos dependentes uns dos outros, e mais ainda dos professores.

Não se pode mudar o mundo sem mudar as pessoas: mudar o mundo e mudar as pessoas são processos interligados, nos quais a educação é a força impulsora. Sem a educação não existe vida no sentido pleno. Existe tão somente a sobrevivência. A compreensão sobre o modo como funciona a sociedade, desvenda as estruturas de dominação e abre caminho para a formação crítica que permite o questionamento de tudo aquilo que se esconde sob a aparência da obviedade. É por esta razão que a educação incomoda, pois ela pode tornar um povo difícil de governar, e impossível de ser escravizado.

Se escrevi este texto é porque fui ensinado a organizar as letras em palavras e a dar sentido a elas em frases e parágrafos. Devo isto a meus professores, e procuro retribuir ensinando com dedicação e gosto. Acredito que nisto reside a grandeza e a beleza de ser professor. Aquele que gosta do que faz e sente orgulho pelo que realiza, é feliz. Sou professor, sou realizado, sou feliz. Parabéns aos professores que, apesar de tudo, se dedicam a ajudar pessoas a se realizarem e, por isso, são merecedores de respeito e consideração.


Professor Dr. Anselmo Alencar Colares

NEM SÓ DE POESIA VIVE O POETA

Foto: de Waldo Otávio Dinelly Sirotheau


“Nem só de poesia vive o poeta
há o “fim do mês”
o agasalho
a farmácia
a pinga
o tempo ruim, com chuva
alguém nos olhando
policialescamente
De vez em quando
um pouco de poesia
uma conta atrasada
um cobrador exigente
um trabalho mal pago
uma fome
um discurso à moda Ruy
E às vezes uma mulher fazendo carinho
Hoje a lua não é mais dos poetas
Hoje a lua é dos astronautas.”

Solano Trindade