A vida de um casal precisa de
momentos leves para balancear as durezas do cotidiano. Eu tento não perder esse
encanto. Por isso decidimos aproveitar que as meninas estavam na casa de uma
amiga e saímos para jantar, eu a dona Bia.
A ideia era comer bem, conversar
sobre a vida, sobre nós, sobre as meninas, sobre o futuro, ela tomando um bom
vinho e eu uma coca-cola bem gelada. Eu estava dirigindo, claro. As pessoas
passam muito tempo de cabeça baixa, olhando o celular e esquecem às vezes de
olhar nos olhos. Era essa ideia. Olharmos nos olhos um pouco mais do que o dia
a dia permite. Mas não deu muito certo.
Os planos de ter uma conversa
tranquila foram abortados pela Jane. A Jane estava na mesa ao lado com mais
três pessoas mudas. Eu acho que eram mudas. Ou, coitadas, talvez só não
achassem mesmo um vácuo para entrar na conversa já que só ela falava. E alto.
Sou manauara, mas os manauaras têm uma característica interessante de apagar a
linha entre o público e o privado. Jane falava como se estivesse no quintal da
casa dela, comendo churrasco e ouvindo Naldo.
Quando sentamos, ela falava sobre
a reforma na casa. Ela havia contratado o pedreiro Sildomar, mas ele, pelo que
ouvimos, estava enrolando. Dizia Dona Jane que pedreiro bom mesmo era o Cássio,
que fazia rápido e não mentia para ela. Cumpria prazos. Dizia também que havia
ameaçado o Sildomar várias vezes. Caso ele não cumprisse com a palavra, ela
chamaria o Cássio que, de tão bom, “lia seus pensamentos” sobre o que ela
desejava fazer. Sei não, mas o Cássio me pareceu um Wagner, o motorista de Amor
à Vida. Edith, digo, Jane reclamou que obra é um buraco sem fundo, que havia
drenado todo o dinheiro dela, atrasando a viagem desse ano para Miami. Sim,
Miami, Orlando e dólares foram o segundo assunto da noite.