segunda-feira, março 12, 2012

AS HORAS...


O frio da noite apalpa-me o corpo.
No lençol do tempo, não encontro calor.
O vento sopra murmúrios suaves,
Trazendo-me fantasias.
Entre leves arrepios
Em minha pele despida.

Na solidão do  tempo.
Frio e ardor se misturam, entre versos e reversos,
Perdidos na ânsia  dos meus medos.

A inspiração,
Escondida no escuro do meu íntimo
Transpira e aspira emoções silenciosas.
O grito contido, permanece calado...
Já não se faz poesia.

O poema mudo agoniza.
As horas passam velozes
E em  meu peito
O frio  dos versos, sem rimas.



Socorro Carvalho



"VOU CONTINUAR COM MINHAS BANDEIRAS ATÉ O FIM", DIZ ROMÁRIO AO R7

Romário de Sousa Faria - Deputado Federal  pelo PSB-RJ

Em seu segundo ano de mandato, o ex-jogador e agora deputado Romário (PSB-RJ) em nada lembra os tempos de futebol, quando ele faltava aos treinos e, por isso, enlouquecia os treinadores. Fora dos campos, o parlamentar surpreende pela assiduidade no Congresso e pela forma firme com que defende as suas bandeiras e o seu ponto de vista, cobrando, inclusive, os colegas por mais trabalho.

Em entrevista exclusiva ao portal R7, ele falou sobre sua atuação como deputado e Lei Geral da Copa, que ajudou a aprovar na terça (6) como integrante da comissão especial que tratou do assunto. Garantindo que “nunca acha, sempre tem certeza” do que diz, defendeu que chegue ao fim o bate-boca entre o Brasil e a Fifa por causa  das polêmicas afirmações do secretário-geral da federação, Jérome Valcke.

Apesar de reconhecer ter divergências com o francês, Romário sugeriu que Valcke seja perdoado. Mas deixou claro: se ele errar de novo, deveria ser proibido de entrar no País.

Leia abaixo a íntegra da entrevista, dividida em tópicos:

O Brasil e a Fifa

Em relação aos comentários de Jérome Valcke sobre a Copa do Mundo no Brasil, o senhor chegou a dizer no Twitter que ele foi mal educado, mas que suas reclamações estavam certas. O que acha do bate-boca que se desdobrou após a frase do secretário?

- Isso não é nem um pouco positivo para o Brasil nem para os brasileiros. A forma colocada por ele foi ruim, ele foi infeliz, deselegante e até mal educado em relação ao povo brasileiro. Mas ele tem 100% de razão, o Brasil está atrasado porque sabia que ia receber a Copa do Mundo desde 2007. E muitas coisas estão onde estão porque o Brasil já era para ter feito e não fez. Essa é a verdade. E não adianta ficar de briguinha e fuxiquinho porque isso não vai levar ninguém a nada. E as coisas têm que andar. As obras de mobilidade urbana, por exemplo, não estão avançando, acredito que só as do Rio estarão prontas e duas ou três em outros estados não vão nem começar. Os estádios talvez estejam prontos, mas com problemas, assim como os aeroportos. Então está tudo errado. E brigar, bater boca não adianta. É claro que o ministro do Esporte precisava dar uma resposta, o Brasil não podia ficar sentado ouvindo o representante da Fifa ficar falando essas coisas do povo brasileiro. Mas as coisas têm que começar a andar. De qualquer forma, essa história teve uma coisa de bom. Depois dessa discussão, a gente acabou aprovando a lei geral na comissão. Já foi um alerta. Se toda semana tiver uma briga e a coisa andar na Câmara assim, é bom.

E o senhor acha que o Brasil vai aceitar as desculpas do Jérome Valcke?

- Eu não sou muito a favor do Valcke e todos sabem disso pelas coisas que já falei para ele. Particularmente acredito que ele é muito arrogante, se acha mais do que é. Mas a gente tem direito de errar, na vida todo mundo erra e pedir desculpas é um ato de coragem e personalidade. Então, qual o problema de aceitar a desculpa do cara? Mas, havendo outra falta dele com uma gravidade como essa, com desrespeito ao povo brasileiro, ele não só não deveria mais ser o interlocutor, como não poderia mais entrar no país. Não sou eu que vou propor isso, mas dessa forma fica combinado.

Presidente da Fifa pede desculpa ao Brasil

 A Lei Geral da Copa

Durante a votação do texto na comissão, o senhor reclamou do item do projeto aprovado na comissão que estabelece uma cláusula penal para quem desistir do ingresso comprado para os jogos. Continua insatisfeito com o assunto?

Eu fiz uma pergunta ao relator [deputado Vicente Cândido] e ele, dentro do entendimento dele, me respondeu colocando um exemplo de passagem de avião, mas eu não entendo assim. Ele diz que você paga uma passagem e, se não viajar, não tem devolução. Tudo bem. Mas, no caso do ingresso da Copa, como ele colocou no relatório, quem comprar e não for será punido. Ele particularmente comentou comigo que ficou uma situação meio dúbia. Mas não pode estar dúbia, tem que ser mais clara. Isso vai ser o tema do destaque, que vou apresentar no plenário quando o texto chegar lá. E também vou apresentar uma emenda no que se refere às pessoas com deficiência, que saíram da lei e não têm nenhum tipo de direito. Eu vou tentar através de emenda colocá-lo.

Mas, na versão aprovada na comissão, foi incluído um item afirmando que o governo e a Fifa vão firmar um acordo para regular o acesso dessas pessoas aos jogos, dependendo da capacidade dos estádios.

Na verdade, nós já conseguimos, não através de lei, mas de doação da CBF, um número de 500 pessoas com deficiência de baixa renda para cada jogo. Esse número pode até ser maior que o que já é de direito dos próprios estádios, que é de 1% do total de cadeiras. Essa doação da CBF já resolveria o problema. Acontece que a CBF pode muito bem amanhã mudar o presidente ou o presidente acordar e dizer “eu prometi, mas não vou fazer”. Então a gente tem que colocar isso na lei.

O senhor não acha que um documento assinado confirmando o compromisso já não seria suficiente?

Seria, mas essa doação é só para os deficientes de baixa renda. Existem deficientes que não são de baixa renda e que não têm condições de pagar 100 dólares por partida. Eles tinham que ter direito à meia-entrada também. E a gente tem que dar esse direito a eles, assim como os idosos e os jovens têm.

Mas, se ampliar tanto o número de pessoas que podem pagar meia, não se corre o risco de a Fifa querer aumentar o preço dos ingressos para compensar os custos?

Não, porque a própria Fifa já tinha me falado que não precisaria a CBF doar, porque eles mesmos doariam [esses ingressos]. A gente não está nem pedindo doação, só que se façam valer as leis estaduais em que os deficientes têm esse direito, incluindo isso no texto [da Lei Geral da Copa].

E o que o senhor achou da liberação de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa?

Lá atrás eu era a favor. Semana passada conversei com algumas pessoas e comecei a pensar que realmente não era uma coisa positiva. Mas aí comecei a refletir e verifiquei que, depois que mudaram o texto, ficou claríssimo que [a venda de bebidas] só vale para as Copas das Confederações e a do Mundo. Os próprios representantes da Fifa já disseram que na Copa [de 2014] só 40% dos ingressos serão para brasileiros. Então esses 60% que vêm de outros países estão acostumados a beber cerveja, por isso fui a favor de liberar a venda da bebida nos estádios. Até porque a Fifa vai passar a ter uma fiscalização maior e vai ter que trabalhar um pouco mais.

O que o senhor temia é que expandisse a liberação da bebida para todos os jogos, indo contra o Estatuto do Torcedor?

Exatamente. A partir do momento em que ficou claro que só vale para essas duas competições, eu me coloquei a favor da lei, porque não vejo nenhum problema. Ninguém vai se embriagar de cerveja para ver um jogo.  Até porque essas pessoas já estão acostumadas a isso. E isso vai fazer com que a Fifa coloque um pouco mais de segurança e esteja mais atenta aos jogos e aos torcedores.

O senhor acha que o projeto será aprovado no plenário da Câmara sem maiores problemas?

Vai porque o governo é maioria, é muito difícil não passar. E espero que seja aprovado com essas duas situações que vou colocar. Mas, na verdade, do que veio [para o Congresso] para o de hoje, já houve mudanças significativas e está mais a cara do Brasil.

Romário no Congresso

O senhor acha que a Câmara consegue votar todos os projetos que estão pendentes como Código Florestal e divisão de royalties, mesmo com ano com calendário apertado, com eleições municipais, festa junina e feriados?

Conseguir, consegue. Eu realmente acho que os trabalhos deveriam ter começado antes, mas não adianta a gente ficar falando do que já passou. Eu acredito que temos condições de votar tudo o que tem na Casa. Isso vai depender até mais da oposição do que dos deputados da base. Tempo suficiente tem, porque temos terça, quarta e quinta-feira. Com o tempo passando em vez dos deputados irem embora quinta-feira, como de praxe, antes do meio-dia, vai ter que estender um pouco mais. Se tiver vontade, disposição e coragem a gente consegue votar. Se depender de mim, eu vou estar aqui.

No início do ano legislativo o senhor reclamou por meio do twitter que estava em Brasília para trabalhar, mas nada acontecia no Congresso. O senhor não acha engraçado que o senhor, que quando jogador tinha problemas com treinadores por atrasos e faltas agora seja um dos deputados mais assíduos e o que cobra os colegas por mais trabalho?

Realmente é engraçado, mas a vida é assim. A gente evolui ou não. No meu caso, graças a Deus, para o trabalho, eu evoluí. Esse é um momento na minha vida que eu estou muito feliz, estou gostando muito do que estou fazendo, o resultado é que vocês têm acompanhado. E na política eu aprendi que quanto mais você faz, e como no meu caso é para o lado do bem, coisa boa, mais resultado positivo você tem.  Por isso eu gosto de trabalhar e estou amarradão em ser deputado. Quanto mais tem para trabalhar, mais eu quero.

O senhor vai continuar este ano com a atuação mais focada no Esporte e nos deficientes como foi no ano passado?

As minhas bandeiras são pessoas com deficiência e com doenças raras, o esporte e a Copa,  e os dependentes químicos, em relação principalmente ao crack. Vou continuar com essas bandeiras até o final do meu mandato





Na Câmara dos Deputados, Romário é o 1º vice-presidente da Comissão de Turismo e Desporto, suplente da Comissão de Educação e Cultura, Vice-presidente da Frente Parlamentar da Pessoa com Deficiência, Diretor de Assuntos Esportivos e Acessibilidade da Frente Parlamentar da Atividade Física.

Genial nos gramados, Romário agora é um campeão a serviço do povo. 

UM CERTO PAJÉ LOURENÇO


Na cerimônia de formatura, no dia 23 de fevereiro, de alunos da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), havia seis índios, cuja permanência no ensino superior foi apoiada pelo projeto Rede de Saberes, o que me fez lembrar um certo pajé indígena que viveu na Amazônia no século XVIII. Fiquei pensando no destino diferente desses jovens índios e do pajé Lourenço, cuja história merece ser lembrada.
Era assim que se chamava: Lourenço, um sábio, que na sua comunidade de origem "acumulava funções de caráter religioso e médico". Ele conhecia as plantas e ervas medicinais da Amazônia, cada uma por seu nome, sabia para que serviam, e usava esse saber para, com ervas e rezas, curar os enfermos. Por isso, foi preso como “feiticeiro”, em 1737, não se sabe onde, provavelmente no rio Japurá – acredita-se – já que ele chegou a Belém do Pará escoltado por uma tropa de resgate, que naquele ano havia subido aquele rio recrutando índios para o trabalho compulsório.


Quem nos fala do pajé é o historiador e padre português Serafim Leite (1890-1969) na sua monumental Historia da Companhia de Jesus no Brasil, de dez tomos e mais de cinco mil páginas. Ele fuçou os arquivos europeus durante algumas décadas, os de Portugal, da Itália e da Espanha, entre outros.


Apoiado em fragmentos de documentos, Serafim Leite reconstitui a vida de "um tal Lourenço", o pajé, que viveu 21 anos sempre como serviçal no Colégio de Santo Alexandre, em Belém, “com muito bom procedimento". O padre Lucas Xavier, em seu Diário de 1756-1760 citado por Serafim Leite, dá um atestado de boa conduta ao pajé: "Não era homem de mulheres nem de aguardente: só uma vez o vi um tanto alegre, que é muito para índios”.


Durante mais de duas décadas, Lourenço ficou proibido de exercer a pajelança. Escondeu o seu saber. No lugar de curar e de rezar, foi carregar água para o lavatório dos padres – “raras vezes faltava nele”. A outra obrigação era “cuidar do horto do Colégio, plantando legumes, cheiros e flores”. Lourenço morreu no dia 27 de setembro de 1758 e foi enterrado na própria igreja do Colégio de São Alexandre, “debaixo do estrado da banda de São Miguel”, sepultando com ele os saberes que foi proibido de exercitar.


Serafim Leite diz que registrou o caso do pajé Lourenço para ilustrar um ponto que ele acha importante de esclarecer, relacionado a dois tópicos geradores de tensão: de um lado, os conflitos entre as religiões indígenas versus o catolicismo apostólico e romano e, de outro, as contradições entre o uso da língua portuguesa e das línguas indígenas, o pajé era proibido de falar a sua língua materna.


O jesuíta português, que em sua adolescência viveu no Rio Negro, onde trabalhou como seringueiro e conviveu com os índios, tenta justificar o fato de aquele homem, que era um sábio indígena – “dotado de boas qualidades” – acabasse se transformando em um obscuro auxiliar doméstico. Não consegue esconder seu incômodo de historiador do século XX com o destino daquele pajé do século XVIII, que foi obrigado a abdicar de seus saberes e de sua língua para limpar penico dos missionários.


Por isso, Serafim Leite tenta justificar a ação missionária, argumentando que essa foi a alternativa mais correta para o Brasil moderno, alternativa que para ele excluía as demais:
- “O que seria melhor para o Brasil, continuar o pajé a ser o primeiro ou o segundo de sua Aldeia, mas pagão, ou o homem útil, trabalhador, morigerado, cristão em que se trocou? Se a primeira alternativa fosse a mais útil para a civilização brasileira, a conclusão seria que se deviam arrasar os arranha-céus do Rio de Janeiro e as fábricas de São Paulo e as Universidades do Brasil, para voltarmos todos à choupana da selva, a pescar à flecha e a contar pela lua...”


Ou seja, já que não se pode explodir os edifícios e fábricas, que se toque fogo, então, nas malocas. Da mesma forma que os colonizadores de ontem e de hoje, o padre e historiador não admite a possibilidade de, no Brasil, conviverem a aldeia e a cidade, a maloca e o arranha-céu, o conhecimento tradicional do pajé e o conhecimento acadêmico da Universidade, a língua portuguesa e as línguas nativas, a medicina indígena e a medicina ocidental. Não via que uma necessariamente não exclui a outra. Ignorava a diversidade, a convivência dos diferentes.


Por causa dessa intolerância, o pajé Lourenço teve de abdicar de sua própria religião e de sua língua. Sua história está cheia de lacunas: não se tem informações sobre sua identidade, etnia, língua materna, lugar preciso de origem, nem detalhes sobre sua relação com os padres da Companhia. Sabe-se, no entanto, que foi condenado como feiticeiro e que seu saber não foi reconhecido como legítimo.


As universidades brasileiras, ao longo da sua curta existência, trataram os índios como o Colégio Santo Alexandre, no Pará, tratou o pajé Lourenço: excluindo-os, a eles, suas línguas e seus saberes. Agora, a presença dos índios está beneficiando as instituições de ensino superior, que ganham muito com a presença deles em seus corredores, salas de aula, bibliotecas e laboratórios.


Essa abertura tem trazido, em alguns casos, mudanças significativas na grade curricular, com introdução de novas disciplinas e a criação de novos cursos como de agroecologia, línguas indígenas, educação ambiental e outros. Na Universidade Federal de Minas Gerais, o Curso de Formação Intercultural de Professores abrigou mais de cem índios, que foram submetidos a um vestibular, onde seus conhecimentos tradicionais tinham algum peso.


É que os índios que hoje freqüentam as universidades levam com eles para dentro da instituição um conjunto de conhecimentos. Foi assim com os Ticuna, Kokama, Kambeba e Kaixana da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) que se formaram no final do ano passado no Alto Solimões e que não foram obrigados, como o pajé Lourenço, a apagar de sua memória o que sabiam.


Foi assim também com os seis índios formados pela UEMS há três dias: Indianara Machado (Enfermagem), Leosmar Antonio e Mary Jane Souza (Ciências Biológicas), Jailson Joaquim (Física), Noemi Francisco (Letras-Inglês) e Genivaldo Vieira (Direito).


Esse dado historicamente novo representa uma tentativa de convivência de culturas, línguas e saberes tão diferentes, mas todos eles legítimos. Tudo isso baseado num princípio claro e cristalino que Marcos Terena gosta de enunciar: "Posso ser o que você é, sem deixar de ser quem sou".
José Ribamar Bessa Freire
26/02/2012 - Diário do Amazonas