Dois arcebispos, um juiz aposentado, um sindicalista e um
procurador da República foram os homenageados deste ano com a Comenda Dom
Helder Câmara de Direitos Humanos. Eles receberam a distinção na manhã desta
terça-feira, no Plenário do Senado Federal, em sessão especial presidida pelo
senador Inácio Arruda (PCdoB-CE).
Estiveram presentes quatro dos cinco agraciados: Dom José
Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba; Felício Pontes Júnior, procurador da
República no Pará; Manoel Conceição Santos, líder sindical; e João Baptista
Herkenhoff, professor e juiz aposentado.
Também reverenciado com a comenda, o arcebispo emérito de
São Paulo, cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, que tem 91 anos, foi representado
pelo padre José Augusto Brasil.
Em discurso, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) enalteceu a
trajetória de Dom Paulo, lembrando, entre outros episódios, que ele liderou o
projeto Brasil: Nunca Mais, que pesquisou e tornou públicas informações sobre a
repressão durante a ditadura militar; e vendeu o palácio episcopal de São
Paulo, destinando o dinheiro da venda à construção de centros comunitários para
os mais pobres.
Para Simon, a homenagem do Senado foi o coroamento de uma
série de iniciativas do Poder Público a favor dos direitos humanos realizadas
neste ano, como a criação de diversas comissões da verdade – na Presidência da
República, na Câmara dos Deputados e nos estados – com o intuito de elucidar,
sem espírito de revanchismo, o que aconteceu durante a ditadura.
Solidariedade
Dom José Maria Pires falou em nome de todos os agraciados.
Ele agradeceu a comenda e prestou homenagem a Dom Helder Câmara, com quem
conviveu por muitos anos. Segundo o arcebispo emérito da Paraíba, o antigo
arcebispo de Recife, que faleceu em 1999, o ensinou a buscar sempre o diálogo,
a amar o inimigo e a viver a pobreza evangélica.
- Ele não tinha carro, andava de ônibus. Não tinha
secretário particular. A cruz peitoral de ouro foi substituída por uma cruz de
madeira. Nunca pregou contra os ricos, mas ensinava que o caminho de salvação
dos ricos passava pelos pobres, não no sentido de que o rico devia se desfazer
de seus bens, mas no sentido da solidariedade – disse.
Dom José Maria Pires disse ainda que a ditadura acabou e que
hoje os males são outros: a violência, que dizima os pobres; as drogas, que
aprisionam os jovens e o sexo sem amor, que transforma as pessoas em objetos.
Para combater tais problemas, ele disse que é preciso ir além de atitudes
defensivas, buscando redescobrir a solidariedade humana.
- Somos todos convidados a dar nossa parcela, por pequena
que seja, para que esse mundo diferente, mas possível, deixe de ser uma utopia.
Assumir esse compromisso é a melhor maneira de honrar o modelo que nos é
proposto, que é Dom Helder Câmara.
Outro condecorado, João Baptista Herkenhoff, também fez
breve homenagem a Dom Helder e o procurador Felício Pontes Júnior dedicou a
comenda “aos procuradores da República que atuam na Amazônia na defesa dos
invisíveis”, como os quilombolas, os índios, os ribeirinhos, os apanhadores de
açaí, e as quebradoras de babaçu.
Na abertura da sessão, Inácio Arruda manifestou
solidariedade a Dom Pedro Casaldáliga, bispo da Prelazia de São Félix do
Araguaia (MT), que também já recebeu, em edição anterior, a Comenda Dom Helder.
Em decorrência das ameaças de morte que tem recebido em função de seu trabalho
em prol das comunidades mais pobres da região, especialmente dos índios
xavantes, ele teve que se afastar provisoriamente de sua prelazia.
Saiba mais sobre os homenageados deste ano:
Dom Paulo Evaristo Arns nasceu em Forquilhinha (SC) e tem 91
anos. Coordenou o projeto Brasil: Nunca Mais, que reuniu informações sobre a
repressão promovida pela ditadura militar. Em 1972, criou a Comissão Justiça e
Paz de São Paulo, fórum de denúncia contra as violências praticadas pelo regime
da época. Em 1985 criou a Pastoral da Criança, com a ajuda da sua irmã, Zilda
Arns.
Mineiro de Córregos, Dom José Maria Pires tem 93 anos. Por
três décadas, foi arcebispo da Paraíba, onde se destacou na defesa dos mais
pobres. Por meio do Centro de Defesa dos Direitos Humanos, fornecia advogados,
assistentes sociais e outros profissionais às pessoas carentes.
João Batista Herkenhoff, de 75 anos, é livre docente da
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Nasceu em Cachoeiro do
Itapemirim (ES). Advogado, promotor de Justiça, juiz do Trabalho e juiz de
Direito, foi um dos fundadores e ainda é membro da Comissão Justiça e Paz da
Arquidiocese de Vitória. Atualmente, também é membro da Associação Padre Miguel
Maire em Defesa da Vida de Vitória e do Conselho de Curadores do Centro Heleno
Fragoso pelos Direitos Humanos, de Curitiba. É militante dos direitos humanos
desde o período da ditadura e já escreveu vários livros sobre o tema.
Felício Pontes Júnior tem 46 anos, nasceu em Belém e é
procurador da República do Estado do Pará. Iniciou sua carreira como advogado
do Centro de Defesa de Direitos Humanos do Rio de Janeiro. Atualmente atua em
casos de improbidade administrativa, na proteção ao meio ambiente e aos direitos
indígenas, das crianças e das comunidades tradicionais.
Manoel da Conceição Santos, nasceu em 1935, em Coroatá (MA).
Sua trajetória começa organizando o Sindicato dos Trabalhadores Rurais no
Maranhão, que chegou a ter 100 mil filiados. Contribuiu mais tarde para a
organização da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e do Partido dos
Trabalhadores (PT). Foi preso e torturado durante a ditadura militar.
Atualmente atua na organização de cooperativas, procurando incentivar a
economia solidária.