Dados também indicam uma mulher assassinada a cada duas
horas; Brasil é o 7º país com a maior taxa de homicídio de mulheres
Cinthia teve um dedo quebrado e o pé trincado por estar beijando uma mulher - Foto: Arquivo Pessoal |
Cinthia Oliveira Abreu teve um dedo da mão esquerda quebrado
e trincou o pé direito depois de apanhar, e muito, de homens que a viram
beijando uma mulher. A agressão aconteceu na região do Vale do Anhangabaú, no
centro de São Paulo (SP). Três rapazes fizeram uma roda em volta dela e da
companheira. “Um se aproximou e deu um murro na minha cara e eu cai. Nisso,
outros dois ficaram me batendo”, conta.
Passado quase dois anos, ela ainda não se recuperou
psicologicamente do ocorrido. Hoje evita expressar sua sexualidade em áreas
públicas. “Eu fico sempre atenta”, diz.
Cinthia foi vítima do que o movimento feminista chama de
lesbofobia, a aversão a mulheres lésbicas. No entanto, tomado de forma mais
ampla, a violência que ela e a companheira sofreram é mais uma expressão do
machismo presente na sociedade.
Os dados brasileiros são assustadores. O Brasil é o 7º país
com a maior taxa de homicídio de mulheres, segundo o Mapa da Violência 2012 –
Homicídio de Mulheres. São 4,4 assassinadas para um grupo de 100 mil. O mesmo
mapa mostra que a cada cinco minutos, uma mulher é agredida. E a cada duas
horas, uma é morta vítima de violência.
Já a Central de Atendimento à Mulher, que disponibiliza o
número de telefone 180 para denúncias, contabilizou de janeiro a dezembro de
2012, 732.468 registros, sendo 88.685 relatos de violência. Por esses dados, a
cada hora, dez mulheres sofrem de maus tratos. A maior parte é vítima de
violência física (56%), seguida de psicológica (28%), moral (12%) e sexual
(2%). Em 70% dos casos, o agressor é o conjugue da vítima. Se considerados
ex-marido, namorado e ex-namorado, o número chega a 89%.
Segundo Maria Fernanda Marcelino, integrante da Sempreviva
Organização Feminista (SOF), entidade que faz parte da Secretaria Executiva da
Marcha Mundial das Mulheres (MMM), cerca de 2% dos homens agressores de
mulheres são condenados. “É uma banalização da violência contra o gênero
feminino”, afirma.
Ela ressalta que, em grande parte dos casos, a vítima é
responsabilizada pela violência sofrida. “Há um julgamento moral. Não pode
caminhar à noite tranquilamente porque se acontecer uma violência, nós
certamente seremos responsabilizadas de termos saído desacompanhadas, por
exemplo”, demonstra.
Casos de violência que ganharam notoriedade na mídia, como o
assassinato de Eliza Silva Samudio, mãe do filho do ex-goleiro Bruno, também
estão carregados de juízo moral. Eliza por vezes é citada como a amante e atriz
pornográfica. “Houve notoriedade diante da opinião pública, mas o verdadeiro
debate das origens da violência não foi feito”, aponta Maria Fernanda.
O movimento feminista também registra denúncias de mulheres
que afirmam que a violência causada por namorados e maridos ainda é tratada
como problema privado nas delegacias do país.
Lesbofobia
A aversão a mulheres que se relacionam com outras mulheres,
além de ser mais uma variante da violência contra a mulher, ascende o debate
sobre a necessidade de aprovação do projeto de lei 122, que criminaliza
práticas homofóbicas.
“A gente sofre por ser mulher e por ser lésbica, porque é
vinculado justamente a ideia de controle da nossa autonomia”, afirma Cinthia.
Ela defende a aprovação do PL 122 como saída para escapar dos “discursos
raiovosos”, estimulados principalmente por religiosos, segundo ela.
“Se a gente não vivesse numa sociedade extremamente
machista, a gente não precisaria de uma lei”, chama a atenção a integrante da
Sempreviva Organização Feminista (SOF), Maria Fernanda Marcelino. “Ainda
prevalece a idéia de que a sexualidade das mulheres está a serviço dos homens”,
complementa a militante, destacando o temido “estupro corretivo” praticado por
homens que acreditam que precisam “introduzir” as lésbicas no mundo das
relações heterossexuais para que elas mudem a sexualidade.
Colaborou Ana Carolina dos Santos Lebre
Fonte:Brasil de Fato