“Num país como o nosso, que tem tantos recursos e onde
muitas igrejas são florescentes de templos invejáveis em tamanho, conforto
etc., pastorais de fronteira estão empobrecidas”, declara bispo emérito de
Goiás.
Dom Tomás Balduíno, bispo emérito de Goiás, pertence a uma
geração de bispos brasileiros que identifica na missão da Igreja uma
transformação social. Ele esteve à frente da criação da Comissão Pastoral da
Terra – CPT e do Conselho Indigenista Missionário – Cimi, onde, ainda hoje,
atua com bastante entusiasmo. Na entrevista a seguir, concedida por telefone à
IHU On-Line, Dom Tomás recorda sua trajetória na Igreja e enfatiza que a “CPT
aconteceu num momento de muita animação, decisão, caminhada e energia a favor
dos pobres. Foi fruto do Concílio Vaticano II e de Medellín”. Para ele, tanto a
CPT quanto o Cimi “trouxeram para dentro da Igreja uma abertura, porque a
convivência com esses povos trazia, na pessoa dos agentes de pastoral das CPTs,
para o interior da Igreja a preocupação com a situação deles”. E conclui:
“Houve um crescimento dentro da própria instituição eclesiástica”.
Poucos dias antes de completar 90 anos de idade, Dom Tomás
Balduíno conversou com a IHU On-Line e diz se sentir “livre”. “Não tenho mais o
governo de uma diocese, mas se eu pastoreio, eu pertenço ao Colégio Episcopal.
Então, tenho na Igreja a atuação referente à missão de pastor”.
Depois de ter presenciado momentos difíceis na Igreja, como
o período militar, Dom Tomás gosta de pensar o futuro da Igreja numa
perspectiva de “esperança”. “O futuro próximo é a continuidade. Agora, o futuro
mais remoto a Deus pertence. Eu acho que tem muito elemento dentro da Igreja no
sentido de uma renovação. Será que isso terá acesso ao governo mundial da
Igreja na pessoa do Papa? Não sei”, conclui.
Dom Tomás Balduíno nasceu em 31 de dezembro de 1922, e no
final do ano passado completou 90 anos. É teólogo católico, bispo emérito de
Goiás e assessor da Comissão Pastoral da Terra. Pertence à Ordem Dominicana.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quando e por que decidiu seguir a vida
religiosa e entrar na Ordem Dominicana?
Dom Tomás Balduíno – Desde menino eu já tinha vontade de ser
padre. Talvez por influência familiar dos tios padres por parte da minha mãe,
ou de um tio padre por parte do meu pai. Na cidade onde morava, Formosa-GO,
havia uma comunidade de religiosos dominicanos franceses. Admirava estes monges
pela vida missionária deles, pelo sacrifício de rodar boa parte do estado de
Goiás a cavalo. Então, me engajei na Igreja, e quando era adolescente fui
encaminhado para o seminário, depois para o noviciado em Uberaba. Mais tarde
estudei em São Paulo e cursei Filosofia; na França, mais tarde, estudei
Teologia, porque faltam professores no Brasil. Nessa época tivemos uma
influência interessante dos precursores do Concílio Vaticano II. Fui ordenado
padre na França e, ao voltar ao Brasil, depois de um certo tempo de lecionar
nas faculdades de Filosofia, meu provincial me designou para a missão
indigenista. Esse foi o início de uma nova etapa. Não que eu escolhesse, mas
fui levado a isso pelas circunstâncias, porque eu era o superior da missão, e a
partir de um certo momento, na década de 1960, fui procurado pelos lavradores
que estavam sendo pressionados pelos proprietários da terra no estado do Pará.
Acabei me envolvendo com esse mundo. Depois também trabalhei com os povos
indígenas. Tive mais contato com o povo Xikrin, do Alto do Itacaiúnas; aprendi
a língua convivendo com eles.
Injustiça social
O que me marcou profundamente foi a questão da injustiça
social no sentido de o governo do estado do Pará vender terras e levar em conta
a população que estava dentro daquele território. Houve conflitos e eu
participei deles no início, porque depois fui transferido para Goiás, como
bispo diocesano, onde fiquei durante 31 anos. Lá me deparei novamente com a
questão da terra, porque é uma região de muito latifúndio, de dominação da
elite dos caiados. Nesse tempo que vivi em Goiás, ajudei a inaugurar duas
fundações importantes para a Igreja e para a sociedade: o Conselho Indigenista
Missionário – Cimi, que foi substituindo pouco a pouco as antigas missões de
caráter paternalista; e a Comissão Pastoral da Terra, que surgiu graças a
Medellín e ao Concílio Vaticano II, nos anos de1972 e 1973. O Cimi surgiu como
opção pelos pobres, mas considerando os pobres como sujeitos, autores e
destinatários de sua própria caminhada, como protagonistas de sua própria luta.
Quer dizer, mudou, naquele tempo, completamente a postura da
Igreja com relação aos povos indígenas e com relação aos camponeses. As
experiências que se tinham eram de criar organizações, confrarias de operários,
trabalhadores rurais ligados religiosamente à Igreja. Na posição da Comissão
Pastoral da Terra, que nasceu em 1975, houve uma revolução Copernicana, assim
como houve no Universo Indígena Pastoral Indigenista de respeitar a condição de
sujeito dos trabalhadores rurais e não objeto de nossa ação caritativa.
IHU On-Line – O senhor foi cofundador do Conselho
Indigenista Missionário em 1972 e seu segundo presidente. Como avalia a questão
indígena no país 40 anos depois?
Dom Tomás Balduíno – Houve avanço no sentido das
organizações indígenas. O próprio Conselho Indigenista Missionário tem numa
nova política de tratamento aos povos indígenas. Em vez de querer confiná-los
em um determinado lugar pastoral, como era antigamente, sugeriu uma proposta –
que no início nos chocou e depois se viu que era o “ovo de Colombo” – de
favorecer assembleias de chefes de tribos diferentes. Tínhamos receio, porque
eram tribos muitas vezes hostis entre si, mas constatamos que eles atenderam ao
convite para se reunirem. Passamos a reunir chefes indígenas em assembleias, e
eles saíam convictos de que o inimigo do índio nunca era outro índio, e que
precisavam recuperar sua cultura e, consequentemente, as terras. Para isso,
eles começaram a se organizar em diversas articulações, associações regionais e
nacionais. Assim, do lado dos índios houve avanço e eles continuam avançando.
O retrocesso foi do lado do governo que, aliado aos grupos
capitalistas do agro e hidronegócio, se negou a demarcar as terras indígenas e
enfraqueceu o próprio organismo da Funai, sucateando, de outro lado, o Incra. A
mesma falta de vontade para com os povos indígenas é a falta de vontade para
com os camponeses em relação à reforma agrária.
Confira a Entrevista completa
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