Poucas pessoas conseguiram definir tão bem os caminhos do
amor como Rubens Alves, numa fábula surpreendente, cujos personagens são uma
pipa e uma flor.
A história começa com
algumas considerações de um personagem que deduzimos ser um velho sábio. Ele
observa algumas pipas presas aos fios elétricos e aos galhos das árvores e
afirma que é triste vê-las assim, porque as pipas foram feitas para voar.
Acrescenta que as pessoas também precisam ter uma pipa solta dentro delas para
serem boas. Mas aponta um fator contraditório: para voar, a pipa tem que estar
presa numa linha e a outra ponta da linha precisa estar segura na mão de
alguém. Poder-se-ia pensar que, cortando a linha, a pipa pudesse voar mais
alto, mas não é assim que acontece. Se a linha for cortada, a pipa começa a
cair.
Em seguida, ele narra
a história de um menino que confeccionou uma pipa. Ele estava tão feliz, que
desenhou nela um sorriso. Todos os dias, ele empinava a pipa alegremente. A
pipa também se sentia feliz e, lá do alto, observava a paisagem e se divertia
com as outras pipas que também voavam.
Um dia, durante o seu
vôo, a pipa viu lá embaixo uma flor e ficou encantada, não com a beleza da
flor, porque ela já havia visto outras mais belas, mas alguma coisa nos olhos
da flor a havia enfeitiçado. Resolveu, então, romper a linha que a prendia à
mão do menino e dá-la para a flor segurar. Quanta felicidade ocorreu depois! A
flor segurava a linha, a pipa voava; na volta, contava para flor tudo o que
vira.
Acontece que a flor começou a ficar com inveja e ciúme da
pipa. Invejar é ficar infeliz com as coisas que os outros têm e nós não temos;
ter ciúme é sofrer por perceber a felicidade do outro quando a gente não está
perto. A flor, por causa desses dois sentimentos, começou a pensar: se a pipa
me amasse mesmo, não ficaria tão feliz longe de mim…
Quando a pipa voltava de seu vôo, a flor não mais se
mostrava feliz, estava sempre amargurada, querendo saber com que a pipa
estivera se divertindo. A partir daí, a flor começou a encurtar a linha, não
permitindo à pipa voar alto. Foi encurtando a linha, até que a pipa só podia
mesmo sobrevoar a flor.
Esta história, segundo conta o autor, ainda não terminou e
está acontecendo em algum lugar neste exato momento.
Há três finais possíveis para ela:
1 – A pipa, cansada pela atitude da flor, resolveu romper a
linha e procurar uma mão menos egoísta.
2 – A pipa, mesmo triste com a atitude da flor, decidiu
ficar, mas nunca mais sorriu.
3 – A flor, na verdade, era um ser encantado. O encantamento
quebraria no dia em que ela visse a felicidade da pipa e não sentisse inveja
nem ciúme. Isso aconteceu num belo dia de sol e a flor se transformou numa
linda borboleta e as duas voaram juntas.
Autoria: Rubem Alves
A Pipa e a Flor – São Paulo, Edições Loyola
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