quinta-feira, junho 16, 2011

QUARTA COM POESIA


Amigas, Amigos,

Ouço muita música com meu filho. Ele é fã do B. J. Thomas (!), eu sou fã da Arca de Noé. Dela, pincei um poema do Vinícius musicado pelo Fagner. Notem o respeito que o poeta demonstra pela inteligência das crianças. Reparem na naturalidade com que ele propõe substantivos, adjetivos e flexões verbais hoje em desuso, porque resolvemos apequenar a Língua em prol, teoricamente, de quem não sabe, ou ainda não sabe, o que está perdendo.
Preconceito lingüístico é achar que alguém, criança ou adulto, é incapaz de absorver a norma culta e um vocabulário mais amplo, que são a chave não só da correta expressão, da correta tradução da alma em palavras, mas antes da sua própria e mais íntima organização. Se nos oferecem tal coisa, privar-nos de tal riqueza, desconfiemos. Não pode ser com boas intenções.

O Leão

Leão! Leão! Leão!
Rugindo como um trovão
Deu um pulo, e era uma vez
Um cabritinho montês
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
Tua goela é uma fornalha
Teu salto, uma labareda
Tua garra, uma navalha
Cortando a presa na queda
Leão longe, leão perto
Nas areias do deserto
Leão alto, sobranceiro
Junto do despenhadeiro
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
Leão na caça diurna
Saindo a correr da furna
Leão! Leão! Leão!
Foi Deus quem te fez ou não?
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
O salto do tigre é rápido
Como o raio, mas não há
Tigre no mundo que escape
Do salto que o leão dá
Não conheço quem defronte
O feroz rinoceronte
Pois bem, se ele vê o leão
Foge como um furacão
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
Leão! Leão! Leão!
Foi Deus quem te fez ou não?
Leão se esgueirando à espera
Da passagem de outra fera...
Vem um tigre, como um dardo
Cai-lhe em cima o leopardo
E enquanto brigam, tranqüilo
O leão fica olhando aquilo
Quando se cansam, o Leão
Mata um com cada mão
Leão! Leão! Leão!
És o rei da criação!
Leão! Leão! Leão!
Foi Deus quem te fez ou não?
Vinícius de Moraes (1913 - 1980)

E, para que não fique a impressão de aborrecimento, vejam que emocionante este outro poema musicado (pelo Toquinho), que fecha o disco.
Grandes abraços, e boa semana,
Jason

O Filho Que Eu Quero Ter

É comum a gente sonhar, eu sei
Quando vem o entardecer
Pois eu também dei de sonhar
Um sonho lindo de morrer
Vejo um berço e nele eu me debruçar
Com o pranto a me correr
E assim, chorando, acalentar
O filho que eu quero ter
Dorme, meu pequenininho
Dorme que a noite já vem
Teu pai está muito sozinho
De tanto amor que ele tem
De repente o vejo se transformar
Num menino igual a mim
Que vem correndo me beijar
Quando eu chegar lá de onde vim
Um menino sempre a me perguntar
Um porquê que não tem fim
Um filho a quem só queira bem
E a quem só diga que sim
Dorme, menino levado
Dorme que a vida já vem
Teu pai está muito cansado
De tanta dor que ele tem
Quando a vida enfim me quiser levar
Pelo tanto que me deu
Sentir-lhe a barba me roçar
No derradeiro beijo seu
E ao sentir também sua mão vedar
Meu olhar dos olhos seus
Ouvir-lhe a voz a me embalar
Num acalanto de adeus
Dorme, meu pai, sem cuidado
Dorme que ao entardecer
Teu filho sonha acordado
Com o filho que ele quer ter

Vinícius de Moraes (1913 - 1980)


Cais do Silêncio - Literatura de Jason Carneiro

Um comentário:

Agradeço sua visita, com breve retorno!! Seu comentário vem somar mais versos em minhas inspirações... grande abraço. Se quiser pode escrever diretamente para o meu email: socorrosantarem@gmail.com