Uma mulher entra no
cinema, sozinha. Acomoda-se na última fila. Desliga o celular e espera o início
do filme. Enquanto isso, outra mulher entra na mesma sala e se acomoda na
quinta fila, sozinha também. O filme começa.
Charada: qual das duas
está mais sozinha?
Só uma delas está
realmente sozinha: a que não tem um amor, a que não está com a vida preenchida
de afetos. Já a outra foi ao cinema sozinha, mas não está só, mesmo numa
situação idêntica a da outra mulher. Ela tem uma família, ela tem alguém, ela tem
um álibi.
Muitas mulheres já
viveram isso - e homens também. Você viaja sozinha, almoça sozinha em
restaurantes, mas não se sente só porque é apenas uma contingência do momento -
há alguém a sua espera em casa. Esta retaguarda alivia a sensação de solidão.
Você está sozinha, não é sozinha.
Então de repente você
perde seu amor e sua sensação de solidão muda completamente. Você pode
continuar fazendo tudo o que fazia antes - sozinha - mas agora a solidão pesará
como nunca pesou. Agora ela não é mais uma opção, é um fardo.
Isso não é nenhuma
raridade, acontece às pencas. Nossa percepção de solidão infelizmente ainda
depende do nosso status social. Se você tem alguém, você encara a vida sem
preconceitos, você expõe-se sem se preocupar com o que pensam os outros, você
lida com sua solidão com maturidade e bom humor. No entanto, se você carrega o
estigma de solitária, sua solidão triplicará de tamanho, ela não será algo
fácil de levar, como uma bolsa. Ela será uma cruz de chumbo. É como se todos
pudessem enxergar as ausências que você carrega, como se todos apontassem em
sua direção: ela está sozinha no cinema por falta de companhia! Por que ninguém
aponta para a outra, que está igualmente sozinha?
Porque ninguém está, de
fato, apontando para nenhuma das duas. Quem aponta somos nós mesmos, para nosso
próprio umbigo. Somos nós que nos cobramos, somos nós que nos julgamos. Ninguém
está sozinho quando curte a própria companhia, porém somos reféns das
convenções, e quando estamos sós, nossa solidão parece piscar uma luz vermelha
chamando a atenção de todos. Relaxe. A solidão é invisível. Só é percebida por
dentro.
Martha Medeiros
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