Às vezes é preciso recolher-se. O coração não quer obedecer,
mas alguma vez aquieta; a ansiedade tem pés ligeiros, mas alguma vez resolve
sentar-se à beira dessas águas. Ficamos sem falar, sem pensar, sem agir. É um
começo de sabedoria, e dói. Dói controlar o pensamento, dói abafar o
sentimento, além de ser doloroso parece pobre, triste e sem sentido. Amar era
tão infinitamente melhor; curtir quem hoje se ausenta era tão imensamente mais
rico. Não queremos escutar essa lição da vida, amadurecer parece algo sombrio,
definitivo e assustador. Mas às vezes aquietar-se e esperar que o amor do outro
nos descubra nesta praia isolada é só o que nos resta. Entramos no casulo fabricado
com tanta dificuldade, e ficamos quase sem sonhar. Quem nos vê nos julga
alheados, quem já não nos escuta pensa que emudecemos para sempre, e a gente
mesmo às vezes desconfia de que nunca mais será capaz de nada claro, alegre,
feliz. Mas quem nos amou, se talvez nos amar ainda há de saber que se nossa
essência é ambiguidade e mutação, este silencio é tanto uma máscara quanto
foram, quem sabe, um dia os seus acenos.
(Lya Luft)
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