Metade do ano se foi e o mês de
julho começa em clima de férias para muitos estudantes, professores e muitos
outros profissionais. (Nesse ano, para recuperar os dias de greve, algumas
universidades federais continuam em atividade nesse mês). No Centro-oeste, é
temporada de acampamentos no Araguaia, como no hemisfério norte começam as
grandes férias de verão. Muita gente aproveita para viajar, visitar outros
países e quem fica em casa, encontra atividades de lazer que no período de
trabalho não pode realizar. Em vários lugares, o turismo planeja colônias de
férias para crianças e, assim, os pais também têm algum descanso.
Na Bíblia, o livro do Eclesiastes
diz que há tempo para trabalhar e tempo para descansar. É verdade que há quem
descanse simplesmente ao mudar de atividades. Para quem lida diariamente com
trabalho intelectual, pode fazer bem plantar uma horta. Já uma pessoa que vive
da manhã à noite em um escritório pode se refazer acampando na natureza ou em
uma viagem, mesmo se cansativa. Outros preferem apenas deixar os dias
transcorrerem sem obrigações de horário fixo, embora o condicionamento social
ainda pressione quando não vê produção e lucro.
Conforme a regra beneditina, a
ociosidade é nociva para a espiritualidade. Gera uma espécie de apatia psíquica,
irmã das neuroses, angústias e outros problemas. É verdade que as tradições
religiosas antigas valorizavam o que chamavam de quietude espiritual, mas São
Bento equilibra essa proposta com a necessidade de ganhar a vida com o trabalho
prático. A proposta espiritual é unir oração e atividade. Evidentemente, isso
nada tem a ver com a tendência contemporânea de produzir a qualquer custo. A
tirania do mercado nos rouba a dimensão humana da vida e cria a competição como
substituto do convívio harmonioso e justo entre as pessoas.
Em um mundo que cada vez mais
substitui trabalhadores por máquinas informatizadas, o filósofo italiano
Domenico de Masi propôs para as pessoas o "ócio criativo”. Não se trata do
desemprego da atual crise econômica europeia e nem de ficar simplesmente na
ociosidade. O ócio criativo é a capacidade de fazer do tempo livre a alavanca
da criatividade para um amanhã mais humano e feliz. Em geral, a sociedade atual
só dá valor ao trabalho. Não valoriza, nem organiza o lazer. Na escola, as pessoas
se preparam para saber o que fazer com 1/7 do seu tempo útil. Mas, todo o resto
do tempo fica sem planejamento. Podemos e devemos planejar melhor o tempo
livre. Aprofundar o sentido e o valor do lazer faz parte de uma cultura que faz
bem ao espírito.
Desde séculos imemoriais, as
culturas negras e indígenas cultivam a capacidade de integrar trabalho e lazer,
estudo da vida e gratuidade. E fazem isso como oferenda de louvor a Deus em uma
postura de festa e de alegria espiritual. Nessas culturas ancestrais, toda a
vida é como tecida de uma só costura e ali se unem sem divisão tanto os
momentos produtivos, como a gratuidade da festa, dos cânticos e do convívio
comunitário e espiritual.
As culturas tradicionais teimam
em testemunhar que tempo é graça e espaço de convivência e não apenas dinheiro,
como pensam os capitalistas. A criatividade do povo tem sido capaz de fecundar
as atividades cotidianas de uma forte energia de amor e alegria. Trabalhos de
educação da juventude e promoção humana consistem em laboratórios de artes
plásticas, grupos de música, escolas de dança e muitas outras formas de arte
que dão sentido novo à vida das pessoas, o que, às vezes, a escola formal não
consegue proporcionar.
Atualmente, é importante
reencontrar uma espiritualidade que valorize a festa, a alegria do lazer e o
direito do descanso. Na Bíblia, o primeiro mandamento de Deus no Gênesis é
guardar o sábado, ou seja, o direito ao descanso semanal. Esse repouso gratuito
é expressão do amor divino e do cuidado amoroso uns com os outros. Em suas
cartas, Paulo propõe que se procure "resgatar o tempo”, isto é, torná-lo
tempo de salvação e graça. Ordena que quem quer comer deve trabalhar, mas
insiste que o tempo seja usado para dialogar, para orar sem cansar e para a
solidariedade. Viver a fé é uma opção de vida que se faz gratuitamente e pede
abertura interior. Ela pode fazer de nossa vida um tempo delicioso de férias
que os antigos chamavam vacare Deum. Poderíamos traduzir isso por "tirar
férias com Deus ou mergulhados em Deus”.
Marcelo Barros
Fonte: Adital
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