Todos os homens morrerão; porém,
o exemplo de Mandela não morrerá
Entre as poucas coisas positivas
que a colonização britânica deixou na África do Sul é que o menino nascido como
Rolihlahla Dalibhunga Mandela foi renomeado Nelson por obra e graça de uma
mestra inglesa. Havia sido muito difícil pronunciar seu nome e sobrenome
familia original da etnia xhoza.
O garoto estudava em tempo
integral e foi um dos primeiros advogados negros quando a África do Sul racista
não permitia esses luxos, logo reforçado pelo "legal” apartheid imposto
pelas autoridades racistas do Partido Nacional.
Inclusive, quando foi preso, onde
esteve durante tantos anos, continuou estudando leis à distância, mesmo quando
seu discurso já não consistia em códigos legais, mas no apoio à luta do
Congresso Nacional Africano (ANC, em inglês) e seu braço armado, Umkhonto we
Sizwe (Lança da Nação).
Na época, ele purgava uma
condenação a prisão perpétua, em Robben Island; era o preso número 466/64 que
olhava o horizonte, quando o permitiam, nessa prisão mar adentro, a 11
quilômetros da Cidade do Cabo.
Hoje, tem 94 anos e cumprirá 95
(caso resista), no próximo 18 de julho. Desde o dia 8 de junho está internado
devido a graves complicações pulmonares e renais. O presidente Jacob Zuma, que
suspendeu uma viagem a Moçambique para estar próximo ao enfermo, declarou que a
situação é sumamente complicada. Mandela está morrendo e essa circunstância
volta a acusar ao ditatorial apartheid contra o qual lutou por toda a sua vida,
visto que as enfermidades pulmonares que o atingiram vêm desde seus tempos de
preso e nunca foram devidamente atendidas.
O histórico personagem pode
morrer a qualquer momento. Será uma grande pena. Por isso, há ainda mais
motivos para ressaltar alguns traços daquele que, através de seu exemplo, vai
perdurar.
A história completa
Após a libertação de Mandela, em
fevereiro de 1990, e com os avanços do ANC rumo ao poder, ganhando as eleições
para uma Assembleia Nacional Constituinte, em 1993, e, em seguida, a presidência
do país (1994-1999), sua figura subiu para o topo das preferências dos povos.
Nessas condições, até seus
inimigos mais pérfidos chegavam a ele para partilhar de suas conquistas, como o
último presidente racista , Frederik de Klerk, nominado junto ao ex-preso para
receber, em 1993, o Prêmio Nobel da Paz.
Curiosa academia que, quando deve
premiar a um revolucionário ou anti-imperialista, o faz colocando ao seu lado
um inapresentável. Da mesma maneira aconteceu em 1973 com o presidente
vietnamita Le Duc Tho, quando levou consigo o criminoso Henry Kissinger e, anos
mais tarde, com Yasser Arafat, distinguido juntamente com Simon Peres e Yitzhak
Rabin.
A verdade é que na luta mais dura
do ANC e com seus dirigentes presos, em seguida condenados no processo de
Rivonia, que acabou levando-os à prisão de Robben Island, a solidariedade com
aqueles vinha de Cuba, da URSS, da China e dos países socialistas, dos partidos
comunistas e movimentos de libertação do Terceiro Mundo, como o MPLA, de
Angola; o Frelimo, de Moçambique; as organizações da Namíbia etc. Do Primeiro e
do Segundo Mundo, pouco ou nada... Em 1980, quando o preso número 466/64 levava
dezessete anos atrás das grades, a ONU pediu sua libertação.
A paz e a guerrilha
Mandela sempre foi um político
popular, advogado, de discurso atraente e grande sorriso: um político de
massas. A isso somava-se um dado fundamental: esteve preso durante 27 anos sem
abdicar de seus princípios e que chegou a ser presidente de seu país; então, é
fácil elogiá-lo.
Está bem que seja assim, mas com
uma condição: teria que falar de toda a sua vida, não apenas de um momento.
Pode-se destacas aspectos de um determinado tempo; porém, sem perder de vista a
biografia geral. Por que esse esclarecimento?
É, agora, que certas agência
internacionais e meios argentinos pintam ao líder como uma espécie de leão
herbívoro, um pacifista, que sempre deu a outra face. O condutor do noticiário
do Canal 12, de Córdoba (grupo Clarín), Gustavo Tobi, disse que Mandela havia
sido sempre um pacifista, que colocava em prática as mesmas táticas de Gandhi.
Essa é uma versão amputada e
falsa. Mandela incorpora-se ao ANC nos anos 50 e nesse momento propunha uma
resistência pacífica ante um desproporcionado Estado inimigo armado até os
dentes e que gozava de proteção internacional pelo Reino Unido (era membro do
Commonwealth) e Estados Unidos. A Carta da Liberdade (1955) propunha os
reclamos da maioria negra oprimida brutalmente pela minoria branca, que
representava apenas 14% da população.
Porém, essa ilusão de abrandar ao
regime, "à maneira de Gandhi” durou até 1960. As contínuas matanças, como
a de Shaperville, empurraram à organização negra (com a participação de alguns
brancos, porque, já naquela época, Mandela tinha um ponto de vista
multirracial) à resistência armada. Formou-se a Umkhonto we Sizwe (Lança da
Nação), conhecido com a sigla MK.
Os princípios
Como e quando Madiba (como é
conhecido em seu país) e seus companheiros se lançaram à luta de guerrilhas,
foi contado por ele mesmo em seu discurso em Cuba, na Província de Matanzas, no
dia 26 de julho de 1991, quando fez a sua primeira e comovedora visita.
"Sabe-se que a resposta do
Estado às nossas legítimas demandas democráticas foi, entre outras, a de acusar
nossos dirigentes de traição e realizar, no início dos anos 60, massacres
indiscriminados. Esses fatos e a proscrição de nossa organização nos deixou sem
outro caminho, a não ser o de fazer o que qualquer outro povo que tenha
respeito próprio faria –incluído o povo cubano-; ou seja, levantar-nos em armas
para reconquistar nosso país das mãos dos racistas”, disse Mandela em meio aos
aplausos de Fidel Castro e de milhares de cubanos nesse ato pelo 38º
Aniversário de Moncada.
Como tantos outros
revolucionários, o sul-africano não era um apaixonado pela violência, mas
recorreu a ela e a justificou quando as elites genocidas não lhje deixaram
outra opção. Enquanto estava preso, um regime já decadente lhe ofereceu a
liberdade em troca de renunciar à luta armada e admitir como legais os
"bantustanes”, ou zonas para negros, que, sob a desculpa da
"autonomia”, eram uma forma de marginalizar aos negros. Naquele momento,
Mandela tirou patente de herói internacional. Negou-se a aceitar essas indignas
condições. Recém saiu da prisão, em fevereiro de 1990, sem capitulações.
Grande amigo de Cuba
Outro aspecto que as agências de
notícias dependentes do Departamento de Estado ocultam ou tergiversam sobre o
personagem é sua profunda amizade com Cuba e com Fidel Castro.
Nas biografias escritas sobre o
sul-africano não está registrada a visita que ele fez à Ilha em 1991, nem a
retribuição da visita do então presidente cubano à África do Sul por ocasião da
toma de posse de Mandela como mandatário, em 10 de maio de 1994.
Outro exemplo da censura,
omissão, esquecimento etc. –que cada um qualifique como quiser- é que na lista
de prêmios internacionais obtidos, estão todos, exceto um. Consignam o Nobel da
Paz, Jawaharlal Nehru ao Entendimento Internacional (Índia, 1980); Simón Bolívar,
da UNESCO (1983); o da Fundação do Terceiro Mundo para os Estudos Sociais e
Econômicos (Reino Unido, 1985); o da ONU no campo dos Direitos Humanos (1988);
Al-Gaddafi dos Direitos Humanos (Líbia, 1989); Lenin da Paz (URSS, 1990); o da
Unesco no campo da Paz (1992); Príncipe de Asturias de Cooperación
Internacional (Espanha, 1992); Gandhi da Paz (Índia, 2001); e o Embaixador de
Consciência da Anistia Internacional (2006).
A essa prolífica nômina, falta a
Ordem José Martí, a máxima distinção de Cuba, que lhe foi outorgada em 1991 por
Fidel Castro em nome de seu país.
E esse não é um detalhe menor. Em
seu discurso de 26 de julho desse ano, em Matanzas, Mandela agradeceu
profundamente a solidariedade e o apoio cubano de toda a vida, desde a própria
da ação política, o envio à liberdade sul-africana que supôs a vitória de Cuito
Cuanavale (1987), em Angola, onde as tropas cubanas e angolanas derrotaram a
invasão dos militares sul-africanos, a ajuda posterior dos médicos cubanos etc.
Porém, é melhor que o próprio
orador do ato mencionado se expresse:
"Sua presença e o reforço
enviado para a batalha de Cuito Cuanavale têm uma importância verdadeiramente
histórica. A esmagadora derrota do exército racista em Cuito Cuanavale
constituiu uma vitória para toda a África! A decisiva derrota das forças
agressoras do apartheid destruiu o mito da invencibilidade do opressor branco!
A derrota do exército do
apartheid serviu de inspiração ao povo combatente da África do Sul! Sem a
derrota infligida em Cuito Cuanavale nossas organizações não teriam sido
legalizadas! A derrota do exército racista em Cuito Cuanavale possibilitou que
hoje eu possa estar aqui com vocês! Cuito Cuanavale marca uma virada na luta
para livrar o continente e nosso país do chicote do apartheid!”.
Quando Mandela morrer, porque
todos morreremos, será chorado em todo o mundo, principalmente na África do
Sul, terra natal, e também em sua admirada Cuba.
[Fonte: Original em espanhol
publicado em La arena.com.ar].
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