domingo, dezembro 08, 2013
PENSAMENTO
Pensamento que vem de fora
e pensa que vem de dentro,
pensamento que expectora
o que no meu peito penso.
Pensamento a mil por hora,
tormento a todo momento.
Por que é que eu penso agora
sem o meu consentimento?
Se tudo que comemora
tem o seu impedimento,
se tudo aquilo que chora
cresce com o seu fermento;
pensamento, dê o fora,
saia do meu pensamento.
Pensamento, vá embora,
desapareça no vento.
E não jogarei sementes
em cima do seu cimento.
Arnaldo Antunes
O QUE AS GATAS ME ENSINAM
Carlota e Elisabeth (Foto: Ivan Martins) |
Uma é tímida, a outra, impetuosa. Ambas são adoráveis e, à
sua maneira, imprescindíveis
Há dois meses ando apaixonado por um par de gatas. Carlota e
Elisabeth. Elas entraram em casa por insistência da minha mulher e viraram
parte da rotina. E da vida. Miam quando eu chego, sobem na cama e cheiram a
minha cara quando acordo, sentam no meu colo quando estou lendo ou quando
escrevo no computador. Eu falo com elas, brinco com elas, ralho com elas, dou
comida e troco a areia da caixinha. Elas me fazem agradável companhia quando
estou sozinho. Em troca, compro religiosamente a ração cheirosa que elas tanto
apreciam.
O fato de ter um par de gatas não me torna um ser humano
melhor, não me faz sentir uma espécie de ativista e nem desconta a minha culpa
– enorme - por não fazer o que é preciso para melhorar a vida das pessoas
desprotegidas do meu país. Não acho, evidentemente, que minhas gatas são tão
importantes quanto as criaturas humanas que me cercam. Mas tê-las em casa me
deixa contente. Cuidar delas e conviver com elas são atos de prazer egoísta que
me fazem bem, e que talvez façam bem a elas.
Também aprendo coisas com as gatas.
CHORA POR MANDELA, MAS ACHA UM ABSURDO POBRE QUERER OS MESMOS DIREITOS
Precisamos de mais pessoas como Mandela.
Pessoas que são capazes de usar a força quando necessário e
adotar uma atitude conciliadora quando preciso. Mas que não descartam qualquer
uma das duas acões políticas.
Por conta da morte de Mandela, estamos sendo soterrados por
reportagens que louvam apenas um desses lados e esquece o outro, como se as
folhas de uma árvore existissem sem o seu tronco e os galhos. O apartheid não
morreu apenas por conta do sorriso bonito e das falas carismáticas do líder
sul-africano, mas por décadas de luta firme contra a segregação coordenada por
uma resistência que ele ajudou a estruturar.
É fascinante como regimes execrados pelo Ocidente foram,
muitas vezes, os únicos que estenderam a mão a Mandela e à luta contra o
apartheid. E como, décadas depois, muitos países prestam suas homenagens a ele,
sem um mísero mea culpa por seu papel covarde durante sua prisão. Ou, pior:
como veículos de comunicação desse mesmo Ocidente ignoram a complexidade da
luta de Mandela, defendendo que o pacifismo foi o seu caminho.
Desculpem, mas a necessária conciliação para curar feridas
ou a tolerância são diferentes de injustiça. E ser pacifista não significa
morrer em silêncio, em paz, de fome ou baioneta. A desobediência civil
professada por Gandhi é uma saída, mas não a única e nem cabe em todas as
situações em que um grupo de pessoas é aviltado por outro.
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